HOJE NA HISTÓRIA – 25 de julho de 1985: Morre Carlos Galhardo, o cantor que dispensa adjetivos
Foi-se o homem, não se calou a voz, eternizada em mais de 1200 musicas gravadas. Era o penúltimo ídolo vivo de uma extraordinária geração de cantores românticos dos anos 30 e 40: a Era do Rádio. À ocasião de sua morte, Sylvio Caldas, o Caboclinho Querido, ficara único sobrevivente.
Já tinham morrido Francisco Alves, o Rei da Voz e Orlando Silva, o Cantor das Multidões.
Castelo Carlos Guagliardi, filho de italianos, nasceu em São Paulo no dia. Mas foi no Rio que cresceu. E curiosamente, foi no banheiro – à falta de outro espaço – que ensaiou e ganhou coragem para um teste na Rádio Educadora do Brasil.
Chamado de Rei da Valsa, na verdade a voz de veludo e falsete permitiu-lhe a ousadia de cantar de tudo: marchinha, samba, blues… interpretando a maioria dos grandes compositores brasileiros. Performance consolidada em uma carreira de mais de 50 anos com a fidelidade de um público próprio, razão de emoções e desmaios por onde passava, o então intitulado Cantor que dispensava adjetivos.
Galhardo nunca escondeu a influência de alguns amigos no início da sua vitoriosa trajetória, como Alberto Simões, o Bororó, violinista que o acompanhou quando cantava no banheiro para o primeiro teste no rádio.
Fiel às amizades, sobretudo as que construiu na aurora da vida artística, Galhardo surpreendeu e emocionou os que o entrevistaram para uma gravação no Museu da Imagem e do Som. O diretor da casa, Ricardo Cravo Albim, transmitiu-lhe a notícia da morte de Alberto Ribeiro. Galhardo silenciou por segundos, enxugou uma lágrima, pediu desculpas pelo pigarro que tentava esconder a emoção e recordou Alberto, dizendo que ele e outro monstro da música popular brasileira – o compositor João de Barro – tinham sido fundamentais no seu engatinhar para a fama. Tanto havia que contar, naquela tarde no MIS, que Galhardo não sabia se falav de sua vida ou se comentava e cantava seus maiores sucessos.Recordou Carolina, de Lamartine Babo, o primeiro sucesso de carnaval; depois a primeira valsa de Ataulfo Alves, e foi versejando maravilhas que o tempo da entrevista se tornou curto para gravar. Mas recordou sucessos inesquecíveis.
Galhardo nunca se considerou um superado pelo tempo. "Estou nascendo outra vez", repetia sempre que anunciava ou cantava uma música moderna. Fez teatro e cinema. Participou de várias peças no Rival, entre elas A Canção da Felicidade e A Bela e a Fera. Mas seu forte era cantar – e cantar no rádio, à época em que o rádio era a televisão sem imagem. E nunca deixou de cantar pelo Brasil afora, em memoráveis excursões.
"O romantismo vai existir sempre. Sempre enquanto houver dois corações". E, entremeando os versos aos comentários: "Gosto de saber que inspirei paixões. No meu tempo de juventude era chamado de o gostosão. Mas nunca fui mulherengo. Só me dediquei a uma mulher, Eulália, com quem estou há anos".
Este era o homem com a valsa na alma do cantor. Foi-se o homem. Ficou a voz.