Andrés Sanchez, do Corinthians, ganha estádio por apoiar Ricardo Teixeira
Num clube cheio de craques, com a segunda maior torcida do Brasil, e uma das mais apaixonadas do mundo, ele conseguiu ficar em evidência sem nunca calçar uma chuteira – longe do gramado, na tribuna de honra.
O presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, não esconde o que deseja e, sobretudo, o que faz no futebol.
Em 2007, o Corinthians passou pelo vexame de ver a sua sede invadida pela polícia. Com autorização da Justiça, agentes recolheram documentos e computadores. O alvo era o então presidente Alberto Dualib.
Andrés Sanchez tinha sido vice-presidente de futebol de Dualib pouco antes: eram os tempos de Carlitos Tevez dentro de campo.
Fora de campo, quem comandava era Kia Joorabchian (representante da então parceira MSI). O iraniano era acusado de usar o clube para lavar o dinheiro roubado pela máfia russa.
Kia e Andrés viraram íntimos. Saiam sempre juntos para aproveitar a noite paulistana.
Dualib acabou condenado a três anos e quatro meses de prisão em regime aberto. Andrés escapou, não se sabe como.
Acuado pela polícia, Andrés pulou rápido para o barco da oposição. E acabou eleito presidente do Corinthians em 2007.
Quem conhece os bastidores da política corintiana, como o jornalista e blogueiro Paulo Cézar Prado, o Paulinho, diz que a parceria com Kia continua.
– O senhor Andrés Sanchez é laranja do senhor Kia Joorabchian. Kia Joorabchian é hoje o presidente de fato do Corinthians e o André Sanchez é o presidente de direito.
Corintiano da velha guarda, Cyborg coleciona denúncias contra Andrés Sanchez. Ele já pediu ao conselho deliberativo do clube informações sobre transferências de jogadores, que considera suspeitas.
– Contratar 130 jogadores para disputar três anos de campeonato? Nem o Dualib que ficou 15, 14 anos no poder contratou tanto. E nem no mundo. Essa metodologia deixa muita dúvida no seu procedimento.
Paulinho investiga negócios suspeitos feitos pelo Corinthians na gestão de Andrés Sanches. Ele entrevistou Dimitris Tzalas – conhecido como "Grego" – que compra e vende jogadores. E já fez vários negócios com o Corinthians.
– É realmente uma quadrilha. Estão ganhando muito dinheiro. Não tem negócio feito no Corinthians que o Andrés não leve comissão. Não é à toa que o chamam de "Taxinha".
– Ele tem cópia dessas transações? Ele tem cópia, ele me mostrou, eu vi cópia dos comprovantes de transferência, dos TEDs bancários.
O empresário também teria dito ao blogueiro que na compra de Souza – um atacante que marcou época pelos gols que não conseguia fazer – o Corinthians pagou 700 mil euros para um intermediário – Carlos Leite – que segundo ele redistribuía o dinheiro.
– Este é o TED da conta do Carlos Leite para a Luppi [R$ 700 mil datados de 11/01/2009]. Tenho outro aqui, do Carlos Leite para o Oliveiro Junior [R$ 350 mil], agora, este daqui você vai reconhecer… da Luppi para o Wagner Martins Ramos… sabe quem é, né?
Wagner foi sócio de Andrés na Sol Embalagens Plásticas, como aparece nos documentos da Junta Comercial de São Paulo.
Hoje, a empresa está em nome de um primo de Andrés – José Sanchez Oller.
José, Wagner e Andrés têm uma vida empresarial movimentada. Já foram ou ainda são sócios de 43 empresas. Elas mudam frequentemente de nome e endereço.
Algumas sequer funcionam. Em um dos endereços, a recepcionista diz que não há ninguém no momento que possa responder pela empresa.
Outro exemplo: um escritório de advocacia em Alphaville, na Grande São Paulo, é a sede no papel de pelo menos três empresas de Andrés, do primo e do amigo Wagner. Mas a recepcionista diz que ali é apenas um endereço para correspondência.
Quando começou a frequentar o Corinthians, Andrés Sanches era um homem pobre. A família vivia do dinheiro de uma banca de verduras no Ceasa de Campinas. Depois, abriu uma fábrica de embalagens.
Hoje, a simplicidade é coisa do passado. Dentro de seu carrão importado, gosta de dizer que é um homem bem-sucedido. Cyborg estranha o padrão de vida do dirigente.
– Como é que milionário não tem nada no nome dele? Ele não tem nenhuma propriedade no nome dele?
Com fama de explosivo e boêmio, Andrés Sanchez virou um personagem importante, não apenas para o Corinthians, mas para a estrutura de poder do futebol brasileiro. Ele virou parceiro preferencial de Ricardo Teixeira, o chefe da CBF. Foi assim que o presidente do time mais popular de São Paulo decidiu votar de acordo com os interesses de Teixeira e da TV Globo, na eleição para o Clube dos 13.
Um dos candidatos era Fabio Koff. Ele prometia uma negociação dura pelos direitos de transmissão do Campeonato Brasileiro.
Ricardo Teixeira, aliado da Globo, lançou outro nome: Kleber Leite, com um cabo eleitoral de peso – Andrés Sanchez.
Kleber perdeu mas Andrés foi premiado pela lealdade: virou chefe da delegação brasileira na Copa da África do Sul.
Em 2011, o corintiano devolveu a gentileza: rompeu com o Clube dos 13 e anunciou que negociaria diretamente com a Globo os direitos do Brasileirão.
Em maio, num encontro com dirigentes, nem fez cerimônia.
– Sou amigo do Ricardo Teixeira mesmo, sou amigo da Globo mesmo, apesar de ser gangsteres, sou amigo não sei de quem, eu não tenho problema não. Agora, eu vejo meu clube.
A declaração pegou mal com parceiros que foram tão generosos com o Corinthians – a ponto de oferecer ao clube a chance de realizar um velho sonho: construir seu próprio estádio.
Manobra para tirar o Morumbi da Copa
Até dois anos atrás, ninguém tinha dúvidas que o Morumbi seria o estádio paulista na Copa de 2014.
O São Paulo, dono do Morumbi, fez um primeiro projeto, e depois de receber novas instruções da Fifa, preparou o segundo desenho, que previa até cobrir o estádio. O custo da reforma era de R$ 256 milhões.
Naquela ocasião, Ricardo Teixeira e o então presidente Lula foram até o estádio e entraram em campo para anunciar que o novo Morumbi reunia as condições para receber o jogo de abertura da Copa do Mundo no Brasil.
Hoje, a promessa, que foi testemunhada por Andrés Sanchez, virou foto na parede.
No ano seguinte, tudo mudou. O motivo: o São Paulo apoiou Fabio Koff para o Clube dos 13, irritando Ricardo Teixeira.
A partir de então, o estádio do Tricolor passou a ser bombardeado pela CBF. O comitê brasileiro fez novas exigências, o que dobraria o custo da reforma. o São Paulo não aceitou, e o Morumbi ficou fora da Copa.
O advogado Francisco Mansur, que coordenava as adaptações do Morumbi para a Copa diz que a decisão de excluir o estádio do torneio foi eminentemente política.
– O Morumbi não ficou fora da Copa por nenhuma questão técnica de reforma. O Morumbi ficou fora da Copa por uma decisão política do presidente da CBF e que também é o presidente do comitê organizador local.
No lugar do Morumbi, entrou Andrés Sanchez com o projeto da Arena do Timão, que teria o custo de R$ 1 bilhão, quatro vezes mais do que a reforma do estádio do São Paulo,
A obra do novo estádio precisa de R$ 420 milhões de dinheiro público – que viriam de incentivos fiscais da prefeitura. E mais R$ 400 milhões de empréstimo do BNDES, também dinheiro público. Ainda assim, a conta só fecharia com mais R$ 180 milhões.
Dinheiro para o estádio do Corinthians
A ata de uma reunião no Corinthians explica como a construtora Odebrecht foi convencida a bancar parte da obra. Segundo o diretor de marketing do clube, Luiz Paulo Rosenberg, a empresa concluiu que poderia lucrar com as obras no entorno do estádio.
– Tá bom, eu vou fazer esse estádio no talo, mas vou fazer viaduto, vou fazer não sei o quê. Quando virar estádio de Copa tem mais dinheiro.
O mesmo diretor usou uma comparação infeliz para convencer os conselheiros de que o estádio seria lucrativo.
– Tem uma taxa de retorno de cocaína e de prostituição. Nada mais tem uma taxa de retorno de 40%.
Polêmicas à parte, Andrés Sanchez, entrega o cargo no fim desse ano e se considera um vitorioso.
Mansur diz que Andrés acredita que o Corinthians vá ser beneficiado com o apoio a Teixeira.
– O presidente do Corinthians acredita claramente que ao apoiar incondicionalmente a CBF vai agregar vantagens que ele diz que são em favor do clube. O tempo vai dizer quem vai se beneficiar dessas vantagens: se o Corinthians mesmo ou as pessoas envolvidas com isso.
Se o estádio ficar mesmo pronto, quem vai pagar as dívidas? A nova direção do Corinthians? E, afinal, ou o homem que se diz amigo de gângsteres, vai deixar a conta para o torcedor brasileiro?
Andrés Sanchez não quis se pronunciar sobre o conteúdo da reportagem. O empresário Carlos Leite negou as acusações. Dimitris Tzalas não negou e nem desmentiu os fatos apontados.
O secretário municipal de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de São Paulo, Marcos Cintra, disse que a isenção fiscal concedida ao estádio do Corinthians trará benefícios à população, como a geração de empregos.