Fúria do clima afeta o interior
Com 27 ocorrências cada uma, as cidades de Cascavel (Região Oeste) e Francisco Beltrão (Sudoeste) foram as que mais registraram desastres naturais no Paraná nos últimos 20 anos. É o que revela um levantamento produzido pelo Centro Universitário de Estudos e Pesquisas sobre Desastres da Universidade Federal de Santa Catarina (Ceped/UFSC), em parceria com a Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec).
O estudo mostra ainda que as adversidades climáticas são mais comuns no Sudoeste do estado: sete dos 11 municípios paranaenses que mais sofreram eventos extremos da natureza ficam nessa região, situada dentro do Planalto de Guarapuava. Os dados estão em uma série de Atlas disponibilizados no mês passado pelo Ministério da Integração Nacional.
O fenômeno mais recorrente entre 1991 e 2010 no Paraná – principalmente no Sudoeste – foram os vendavais. Em seguida, nesta ordem, aparecem as inundações bruscas (as populares enxurradas), as chuvas de granizo e as estiagens – como a de 2005, em que os prejuízos à agricultura paranaense ultrapassaram R$ 1 bilhão.
Primavera
No Paraná, historicamente, o alerta soa mais na primavera, entre setembro e outubro. Foi nesta época do ano que mais se registrou a ocorrência de vendavais, muitas vezes acompanhados de chuvas de granizo e enxurradas. Eventos que, segundo os pesquisadores da UFSC, estão associados a fatores como as constantes frentes frias, ciclones extratropicais e os chamados cavados – regiões de pressão atmosférica baixa.
O levantamento não contabilizou os estragos físicos e prejuízos financeiros causados pelos eventos, mas registrou o total de pessoas afetadas nos últimos 20 anos: pelo menos 3,6 milhões de paranaenses foram atingidos de alguma maneira, em 355 dos 399 municípios. Esses números colocaram o Paraná em sexto lugar no ranking dos estados que mais registraram desastres naturais no período.
A Região Sul foi responsável por 34% dos 31,9 mil eventos extremos registrados no país. A chuva, seja em pouca ou grande quantidade, foi o catalisador dos desastres na região: 62% das ocorrências foram de estiagens e enxurradas.
Os resultados apresentados pelo Atlas são alvo de ressalvas de especialistas e agentes da Defesa Civil. A principal crítica diz respeito à origem dos dados, que se limitam aos registros oficiais feitos pelos gestores municipais. "O objetivo em se fazer esses registros é conseguir recursos do governo federal. Então, há fatos que podem não ter sido registrados e aqueles que podem ter sido supervalorizados", afirma o responsável pelo Centro de Apoio Científico em Desastres (Cenacid) da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Renato Lima.
Integrante do Ceped/UFSC e supervisor do projeto dos atlas, Jairo Ernesto Krüger destaca que o levantamento é apenas um primeiro passo para outras pesquisas. "Não estamos 100% certos. Agora, o objetivo é que outras universidades e órgãos evoluam nessas questões [contagem de desastres naturais]", diz.
União vai doar equipamentos para 106 cidades
A Secretaria Nacional de Defesa Civil (Sedec) lançou um projeto para fortalecer parte dos municípios em que as defesas civis funcionam de forma precária. Ao todo, 106 cidades poderão solicitar equipamentos e veículos – em contrapartida, terão de organizar as estruturas locais e preparar um plano de contingência para desastres.
No Paraná, quatro municípios poderão participar do projeto: Capitão Leônidas Marques, Morretes, Rio Branco do Sul e União da Vitória. Segundo a Sedec, as cidades foram escolhidas a partir de levantamentos que apuraram o número de eventos extremos, pessoas desalojadas, desabrigadas e mortas ao longo dos anos. Além disso, todos os 106 municípios têm população inferior a 80 mil habitantes e receita per capita menor que três salários mínimos. Entre os itens a serem doados para cada município estão caminhonete com tração 4×4, tablet, computador, máquinas fotográficas, aparelhos GPS, coletes de identificação e até materiais básicos como capas de chuva e trenas.
O telhado da Escola Municipal João Batista Stocco (foto), em Colombo, na Grande Curitiba, foi arrancado por um vendaval ontem de manhã. Dos quatro blocos das instalações, três foram atingidos, e um deles teve perda total. Ninguém ficou ferido. A escola tem 579 crianças com idades entre seis e 12 anos matriculadas, sendo 120 em contraturno ficando o dia todo no local. A prefeitura do município informou que foi aberta uma licitação de emergência para a restauração da escola, mas ainda não há previsão para o retorno das aulas, que foram suspensas. De acordo com a Defesa Civil de Colombo, cerca de 40 residências também ficaram destelhadas devido ao vendaval.
Explicação
Ocorrências no país cresceram 286%; maior notificação pode ser a causa
O aumento dos registros de eventos extremos nas duas últimas décadas no Paraná e no Brasil é gritante. Segundo o levantamento da UFSC, as ocorrências cresceram 52% no estado e 286% no país. Mais registros, porém, não significam necessariamente mais desastres. "Na década anterior (entre 1991 e 2000), muitos documentos de registros acabaram sendo extraviados. Na Bahia, por exemplo, não encontramos documentos de 2003 para trás", afirma Jairo Ernesto Krüger, um dos supervisores do Atlas.
Para o major Norton Alexandre Kapp, coordenador da 12ª Coordenadoria Regional de Defesa Civil do Paraná, que abrange Francisco Beltrão e outros 26 municípios, a anterior subnotificação pode explicar o fato de o Sudoeste paranaense ter aparecido como a região que mais registrou desastres nos últimos 20 anos. "Há um bom tempo, temos nos empenhado em registrar todos os eventos. Por isso, sobressaímos nas estatísticas", defende.
406,3 mil pessoas foram afetadas de alguma forma em Curitiba, de 1991 a 2010, por eventos extremos da natureza. Nesse período, a capital decretou situação de emergência 16 vezes – nove devido a enxurradas.
Coordenadorias
Apenas 13 municípios do interior não têm Defesa Civil instalada
Principal entrave às ações de prevenção e resposta a desastres naturais no país, a falta de estrutura das defesas civis municipais aos poucos tem sido minimizada no Paraná. Levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 mostrou que, dos 399 municípios do estado, 159 não tinham uma Coordenadoria Municipal de Defesa Civil (Comdec) instalada. Atualmente, segundo a Defesa Civil estadual, apenas 13 cidades não têm um coordenador responsável.
Segundo o chefe do Setor Operacional da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil, capitão Romero Nunes da Silva Filho, os coordenadores têm recebido treinamento para produzir os próprios planos de contingência, com o apoio de outros órgãos e profissionais de cada cidade. A operacionalização do plano é feita pela internet, o que possibilita que os demais órgãos de segurança e a Coordenadoria Estadual tenham acesso imediato às ações previstas.
"Ás vezes, o coordenador era a única pessoa que atuava pela Defesa Civil no município. Agora, ele é estimulado a organizar outros profissionais e instituições e definir o que cada um fará em casos de eventos extremos", explica.
Outra evolução, segundo o capitão, é o mapeamento das áreas de atenção no estado. Mais de 400 áreas, com históricos de enchentes e alagamentos, por exemplo, foram mapeadas em cerca de 200 municípios.